O Natal de 2011
Sergio da Motta e Albuquerque
Neste Natal a fé fugiu. Levou minha alegria, meus presentes e tudo o que eu tinha. Fui à Missa. Cumpri os ritos. Mas o rosto ficou impassível. A alma, esmigalhada. Voltei para casa e troquei a roupa pomposa que escolhi para a ocasião.
Na minha casa não há ninguém. A minha família foi dispersa. E eu espantei todos e todas que poderiam estar comigo. A culpa que eu carrego me consome. Eu queria ser feliz. Mas este ano deixou-me uma marca indelével: eu vi o que realmente sou, e as coisas terríveis que sou capaz de fazer. E dizer, principalmente. Porque eu separo, de forma absurda e cruel, as duas coisas: o falar e o fazer.
Posso pronunciar terríveis impropérios, posso despedaçar corações. Porque eu acreditava, em meu imenso erro, que palavras não significavam nada. Uma vez o Guilherme Arantes cantou estes versos: “o que conta é o sentimento, e não palavras, quase sempre traiçoeiras”... Alguém ainda se lembra dele? Que coisa horrível é ser esquecido.
Houve Natal. Eu sei que houve Natal. Vou ficar aqui a esperar. Quem sabe ele passa também aqui em casa? Quem sabe o meu pai não volta dos mortos e me consola? Quem sabe a Graça Abençoada me alcança, aqui, no deserto em que vivo? Na solidão vou esperar nascer Jesus no coração.
Peço perdão pela rima pobre. Mas é tudo o que posso oferecer agora: dor, pobreza d’alma e desalento: tanto faz. Pois neste Natal a fé fugiu, acabou-se o meu ardor e eu fiquei só com a minha dor.