Sergio da Motta e
Albuquerque
Um homem só tem que lutar dia a dia para manter sua sanidade.
Seja em sua casa, seu quarto, sua cela de prisão. Diariamente ele deverá
livrar-se dos pensamentos mortais, dos desejos impossíveis de serem realizados,
da vontade de abandonar-se ao sono até que sua memória esteja limpa de tudo
aquilo que mais o magoou um dia.
Um homem só deverá livrar-se da pena de si mesmo, da
tentação à auto-comiseração. Um homem só tem que ter piedade e generosidade,
pois anos de solidão farão dele um tirano, que não tem nada nem ninguém entre
ele e suas vontades. Uma criatura intolerável que não pode ser contrariada. Por isso o homem que vive só deve vigiar a si
mesmo. Para não passar como um trator sobre os sentimentos e vontades daqueles
que ainda estão ao seu alcance neste mundo.
Finalmente, um homem só deve chorar por todo amor que perdeu
nesta vida. Só porque algumas circunstancias muito além de seu controle fizeram
dele uma criatura diferente de tudo aquilo que ele um dia sonhou para si, e
deixou escapar. Porque era um homem só, bruto e sobretudo inconsciente. Que nunca
soube que as coisas deste mundo aparecem aos nossos olhos como estando
organizadas ao nosso redor. E que isso é apenas uma imperceptível e cruel
ilusão da percepção que temos do universo.
Infelizmente, ele descobriu tudo isso tarde demais...
Rio
de Janeiro, 1 de junho de 2012