Fui visitar uma
amiga e soube da morte do Geneton. Ele foi um dos meus professores
anônimos e me ensinou que “jornalismo é contar a uma pessoa algo
que ela não sabe” - Geneton era um contador de histórias. O
choque de sua partida foi grande e minha companheira notou minha
emoção. Nós dois (eu e o Geneton) somos da mesma geração.
Gostávamos das mesmas músicas e também tínhamos em comum o sangue
pernambucano.
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Fonte: Mídia promocional do programa Observatório da Imprensa, TV Brasil. Wikimedia Commons |
Por favor esqueçam
o parágrafo acima. É tudo mentira Ou quase tudo. Não quero mentir
agora. Quero ser Geneton também. Fui a casa de minha mãe e lá eu
soube da saída de cena do grande jornalista. O resto é real. Perdão
, grande jornalista e caros leitores, por tentar iniciar uma
homenagem sem fatos concretos. Mas, como ele foi um de nossos
primeiros seguidores do “New Journalism” de Wolfe, Talese e
Thompson, peço a devida vênia para tentar abordar um assunto desta
forma mais humana e subjetiva.
Fui para casa e não
mudei de roupa. Sentei ao computador e comecei a imediata leitura de
suas entrevistas e narrativas. A TV ficou ligada em canal de
esportes, por conta de uma Olimpíada que cativou o mundo e deixou um
legado de saudades e alegrias efémeras. Li José Saramago, Gay
Talese e Nelson Rodrigues. Parei as 3 da manhã. O resto deixei para
depois. Seguirei lendo o Geneton. Não faço promessas, mas sempre
recorri ao seu acervo pessoal e público de entrevistas - Geneton
sabia ouvir e reptar. Em seu blog ele se declarou
“agente-provocador”, e não jornalista. Depois parei e quedei
meio hipnotizado pelo brilho vazio das telas em minha sala. Por
algumas hora eu fiquei ali. Parado. Imóvel. Triste.
Não me interessam
os detalhes de sua súbita partida. Geneton se foi. Cruzou o rio com
seu gravador e suas fitas. Seu mundo ele legou a nós, um universo
de narrativas históricas reunidas em entrevistas e “dossiês” da
maior importância para a sociedade brasileira. Não sei para onde
foi o grande jornalista, mas onde quer que seja ele seguirá
perguntando. Sempre a acreditar que há uma boa história por trás
de fatos ordinários. Ele sabe que a tendência dos homens é ocultar
as grandes histórias da mesquinhez dos seus iguais. E que a vida é
muito mais espantosa que a mais espetacular das fantasias da
literatura e do cinema
Lembro de um artigo
dele publicado no Observatório da Imprensa em uma edição em que eu
também publiquei algo. Foi uma honra ler seu nome perto do meu.
Geneton era generoso e sempre ajudou quem estudava jornalismo. Um dia
foi obrigado a acusar um aprendiz mal-agradecido que o acusou de
plágio. “Um jornalista só tem sua palavra”, disse ele em sua
matéria, em meio a quase culpa que sentiu quando viu o desamparo de
seu acusador no Tribunal - Geneton era um homem bom. Sinto muito
nunca ter tido a chance de conhecê-lo. Não vou perguntar por quê,
para que, ou a que serve a sua partida. “Ponto. Parágrafo”.
Obrigado, Geneton.
Moraes Neto era
muito culto. Com aquele jeito simples ele enganava muita gente. Após
uma ou duas horas de leitura fica muito claro que ele era um
profissional completo e um intelectual do povo. Mesmo sem ser
fotógrafo (somos de uma geração que partia do pressuposto que todo
repórter também tinha que ser fotógrafo), ele dominava quase todas
as modalidades de jornalismo: reportagens de rua, transmissões de
rádio e TV, entrevistas, direção de TV e cinema. Geneton cursou
cinema na Sorbonne. Nos últimos tempos acabou professor informal de
seu colegas. Ele sentia nojo do mau jornalismo
É bom ler seu blog.
Com aqueles erros que caracterizam esses diários eletrônicos, a
leitura é mais viva e humana. Geneton deixou um legado precioso e
sua morte me deixou perdido. Ninguém foi melhor que ele no Grupo.
Ao diabo com o Grupo. Vá em paz, Geneton. Eu não sou digno de
escrever sua elegia. Só tenho mais uma coisa a dizer : Geneton se
foi sem ter tido a devida importância reconhecida. O Grupo nunca vai
lhe fazer justiça, e eu peço a Deus que me faça errado. Porque é
muito triste estar certo e ver uma injustiça acontecer em estado de
impotência. Prefiro estar errado por completo, e ver a vitória do
justo e certo sendeiro. Luminoso como o teu, Geneton.
Rio de Janeiro, 23 de agosto de 2016